Nesta quinta-feira, a Lusa transmitiu uma notícia sobre a constituição da comissão de revisão constitucional. Nessa notícia o jornalista que a escreveu decidiu listar os deputados da forma que podemos ver acima na imagem.
No entanto, melhor do que a agência Lusa ter identificado a deputada Romualda Fernandes como identificou, só os órgãos de comunicação social, como por exemplo o Expresso e o Observador, a difundirem exactamente o mesmo sem se terem preocupado minimamente em rever o conteúdo. Isto é como aquele aluno que copia os trabalhos de casa todos de um colega incluindo o nome.
Acho que estamos de acordo que a forma como a deputada foi identificada é realmente inaceitável e inqualificável, demonstrando um claro racismo do autor da notícia, mas tenho de dizer que foi também totalmente desnecessário, o que torna tudo ainda mais gratuito. Se era para fazer essa associação ao nome, ao descrever os deputados, teria feito muito mais sentido ter colocado "Jamila Madeira (Branca)".
O jogador Racismo Não tem estado incrível nesta jornada do campeonato português de futebol. Parece que está em todo o lado do campo ao mesmo tempo e farta-se de marcar golos. A jogar assim prevejo uma transferência muito em breve para uma das grandes equipas europeias.
Pareceu-me foi um bocado racista o Racismo Não ter levado cartão amarelo e cartão vermelho.
Vai ser bastante bom que, assim que esta jornada terminar, acabou-se o racismo em Portugal.
Só não sei como nunca ninguém se tinha lembrado de uma coisa destas. Medidas efectivas para punir quem tem comportamentos racistas? Que estupidez! Para quê fazer isso quando se pode mudar os nomes nas camisolas e resolver tudo. Os racistas vão ver os jogadores com os nomes a dizer Racismo Não, cair em si e deixar de ter comportamentos discriminatórios. Fim do racismo. E tudo graças à Liga Portugal.
Aquando da morte de George Floyd pela polícia, escrevi um texto que continha esta parte:
Esta situação toda que deveria levar a manifestações de defesa de direitos humanos, independente da cor, foi aproveitada e desvirtuada, levando a pilhagens, tumultos, motins, e ataques às forças de autoridade. Isto é uma mistura explosiva. Num país em que qualquer pessoa pode ter uma arma, em que a criminalidade é violenta e que a ação policial é conhecida por ser musculada, entramos em ciclo na perpetuação de preconceitos e de violência. Nada de bom vai sair dali.
Três meses entretanto passaram e, pasme-se, acertei. Só não acerto é no Euromilhões, mas o facto de não jogar também não ajuda. A verdade é que também não foi assim muito complicado. Não é preciso ser grande vidente para adivinhar que violência iria gerar mais violência e que radicalismo iria gerar mais radicalismo.
A História realmente tende a repetir-se e, cada vez mais, estamos a ficar com um contexto social parecido com o de há 100 anos. Depois fica toda a gente espantada como se chegou a tal, enquanto se aponta dedos aos outros.
Uns apoiantes do CHEGA!, na última manifestação, utilizaram uma criança negra com um cartaz amarelo com a mensagem "sou adotada, angolana, meus pais são Chega" e uma bandeira do partido na mão. Comportamento totalmente errado e aproveitamento político óbvio.
Tudo podia ter ficado por aqui, mas não. Como estamos na época das redes sociais, muita gente, ao ver essa imagem, ficou tão indignada com este aproveitamento político que decidiu então fazer novo aproveitamento político para condenar o outro aproveitamento político. Como se existisse um aproveitamento político bom e um aproveitamento político mau na utilização de uma criança. Resultado, Comissão de Proteção de Crianças e Jovens envolvida.
Ironicamente nisto tudo, a criança foi trazida de Angola e afinal ainda não tem o processo de adopção concluído, ou seja, no pior dos casos, aqueles que tanto apregoam a luta contra o racismo em Portugal podem vir a ser os responsáveis por mandar a pobre criança "de volta para a sua terra".
Por outro lado, é estranho (para dizer o mínimo) que uma criança angolana tenha vindo para Portugal com alguém que, legalmente, não lhe é nada. Mais outra ironia, apoiantes do CHEGA! contribuirem para uma espécie de imigração ilegal.
Há racismo em Portugal? Há. Não parece que haja grande questão aqui. Estive a olhar para o mapa-mundo e não consegui identificar um país onde se pudesse dizer que não haja racismo. Portanto, Portugal não é diferente.
Ainda ontem, no caso do assassinato de Bruno Candé Marques que ocorreu em Moscavide, uma mulher estava a ser entrevistada pela CMTV sobre o caso e a dizer que se devia acabar com o racismo, logo após ter acabado de referir que "o senhor também não se metia com ninguém, apesar de ser de cor". Isto é um exemplo claro do típico "eu não sou racista, mas...". Não é como se o racismo só começasse a contar a partir do momento em que se mata alguém.
Dito isto, há dois conceitos que são diferentes e estão a ser confundidos neste caso: crime com motivações raciais e racismo.
Isto pode ser polémico e controverso, mas, da mesma forma que se um muçulmano cometer um crime não é logo terrorismo religioso, um racista cometer um crime não o torna automaticamente num crime com motivações raciais. É "simplesmente" um crime cometido por um racista.
Em Lisboa, aparentemente, parece que nunca ninguém viu, mas velhos a matar alguém pelos motivos mais fúteis possíveis é apenas mais um Sábado normal por esse Portugal afora. Velhos que pegam numa enxada e dão noutra pessoa, porque um ramo da árvore está a passar para cima do seu terreno. Velhos que vão a casa buscar a caçadeira para dar dois tiros a alguém, por qualquer coisa que foi dita enquanto jogavam às cartas. Velhos que matam as mulheres, porque imaginam que elas aos 70 e tal anos os estão a trair. Praticamente todos os meses há notícias destas.
Um velho, começar um conflito com alguém, porque se passou da cabeça com alguma coisa sem sentido, é o dia-a-dia. Infelizmente. Muitos idosos chegam a uma determinada altura das suas vidas e já não querem saber de si e muito menos dos outros.
Neste caso em concreto, pelo que foi noticiado, começou com um conflito por causa da cadela da vítima uns dias antes, que depois escalou de uma maneira absurda e, provavelmente em grande parte, devido ao racismo do agressor (pelo que se soube de frases proferidas). Ora, isto não faz que seja automaticamente um crime com motivações raciais. O homem não ia a passear na rua com uma arma e escolheu uma vítima aleatória exclusivamente por causa da cor da sua pele. Não, ele escolheu aquele indíviduo especificamente, Bruno Candé Marques, com uma motivação absurda qualquer que só ele saberá explicar (ou provavelmente nem ele próprio).
Agora, infelizmente, devido à idade do agressor, a Justiça será sempre injusta neste caso. Um homem na flor da idade partiu, 3 crianças têm a sua vida completamente estilhaçada ao ficarem sem o pai e o agressor deverá ficar apenas uns poucos anos na prisão até falecer ou adoecer gravemente.
Já todos devem ter visto esta imagem deste homem que estava na manifestação anti-racista a salvar o contramanifestante de extrema direita da multidão em fúria. É uma imagem forte. Mas olhem para a cara do gajo que está a ser carregado e ponham-se dentro da mente dele. Racista, atordoado e a ser carregado por um negro, com os outros gajos negros atrás a gritar. Isto devia estar no top 5 dos seus piores pesadelos. Provavelmente devia estar a pensar que o iam levar para uma gruta e sacrificá-lo num ritual africano qualquer. Aposto que se deve ter borrado um bocado.
Se isto do vandalismo das estátuas continua, uma das próximas ainda é a do Fernando Pessoa.
É que o Fernando Pessoa era tão racista que tinha uma data de heterónimos e eram todos brancos. Por outro lado, se tivesse algum heterónimo negro seria blackface literária. Ia ser complicado nestes tempos.
Eu não sei quem escolhe os filmes que passam na SIC, mas, quem quer que seja, tem a sensibilidade de um bloco de granito.
Qual terá sido o raciocínio para meter o "Selma - A Marcha da Liberdade" e logo a seguir, sem um intervalo sequer, o "Velocidade Furiosa 7"?
Epá, isto da luta contra o racismo está a bater forte agora, o que é que temos aí de filmes que podemos meter? Selma? Não conheço a gaja... É sobre o quê?... Uma marcha liderada por Martin Luther King Jr. contra a segregação racial e pela defesa dos direitos da comunidade negra nos EUA? Perfeito, perfeito, é mesmo isso. Mas precisamos de outro filme para meter a seguir... Que tal o Velocidade Furiosa 7? Tem o The Rock. E ainda tem gajas, tiros, explosões e perseguições a alta velocidade. Se não estou em erro, até era sobre isto que o Martin Luther King se estava a referir quando disse que tinha um sonho. Só podia, quem é que sonharia com outra coisa qualquer?
Desde o início deste caso da morte de George Floyd que queria escrever um texto sobre o assunto, mas não queria que fosse a quente, porque assuntos destes não devem ser vistos precipitadamente. Como a temperatura sobre este caso está cada vez maior e não parece baixar decidi então avançar, mesmo podendo fazer julgamentos precipitados face ao que se possa vir a saber no futuro.
Este é um caso que me deixou bastante confuso. Não é normal ver-se um homicídio de uma pessoa gravado. Mais, não é normal ver-se o homicídio de uma pessoa ser efetuado por um agente da autoridade, alguém que deveria saber a lei e fazê-la cumprir adequadamente.
Deixou-me confuso também pelo facto de os agentes envolvidos terem sido logo demitidos, mas terem passado quatro dias até o responsável pela morte de George Floyd ser detido e acusado. Quando os despediram, podiam muito bem detê-los na mesma altura.
Finalmente, deixou-me confuso pela associação da morte logo a racismo. O que eu vi foi um homem algemado, imobilizado, a dizer que não conseguia respirar, enquanto um polícia tinha o joelho sobre o pescoço dele, sufocando-o. Neste comportamento eu vejo um abuso da autoridade misturado com um uso excessivo e desproporcional da força. Foi o racismo que fez os agentes procederem daquela forma? Não sei. Tanto pode ter sido como não. No entanto, não há nada ali que me diga que se tivesse sido numa detenção de um homem branco as ações tivessem sido diferentes. Agora que o agente foi detido, provavelmente irão investigar e ver se já teria outros casos anteriores que indiquem comportamentos racistas ou outros casos de violência policial, mas de momento ainda não se sabe de nada. Teremos de esperar para ver, sabendo que, independentemente das circunstâncias, será preciso que a Justiça cumpra a sua função e puna os culpados adequadamente.
Esta situação toda que deveria levar a manifestações de defesa de direitos humanos, independente da cor, foi aproveitada e desvirtuada, levando a pilhagens, tumultos, motins, e ataques às forças de autoridade. Isto é uma mistura explosiva. Num país em que qualquer pessoa pode ter uma arma, em que a criminalidade é violenta e que a ação policial é conhecida por ser musculada, entramos em ciclo na perpetuação de preconceitos e de violência. Nada de bom vai sair dali.
Podemos dizer com certeza absoluta que George Floyd foi morto devido a racismo? Não, não podemos. Podemos dizer que os incidentes posteriores vão despoletar mais racismo? Sem dúvida!